14. A relação entre Filosofia e Ciência

Os gregos falavam que a ciência era uma episteme, ao contrário da opinião, que era uma doxa. Neste caso a Filosofia serve como instrumento em busca da verdade científica e tem por finalidade melhorar a compreensão que os homens têm das coisas em seu mundo. O povo, de forma geral, sustenta verdades que os filósofos chamam de “senso comum”. O ideal da filosofia é levar os homens ao “senso crítico”, fazendo-os passar da opinião para a ciência.
Quando a Filosofia se relaciona com o pensamento científico acontece um choque de idéias, pois o senso crítico dos filósofos os leva a enxergar inverdades nos postulados científicos. Aliás, a Filosofia chama estas inverdades de pseudociências, falsificações científicas. Logo percebemos que a Filosofia da Ciência não aceita parcerias com os embusteiros da razão.
Esta postura prepotente da Filosofia tem lhe custado caro, pois muitos filósofos sofreram tanto a perda de seus bens materiais como a pena de morte por causa de suas idéias ousadas. Sócrates é um exemplo clássico de mártir da Filosofia. Ele foi condenado à morte por defender sua liberdade em pensar de forma crítica e não convencional. Já Platão, em sua alegoria da caverna afirma que o verdadeiro filósofo acaba sendo morto pelos homens a quem deseja libertar.
O filósofo Fracis Bacon ensinava que “saber é poder”, mas para alcançar este poder seria necessário enfrentar camadas e mais camadas de inverdades lendárias inventadas pelos senhores das tribos, dos fóruns, das cavernas e das academias. Quanta inverdade foi ensinada aos homens em nome da ciência! Isto provocou um retrocesso incalculável para a história humana.

O filósofo Renê Descartes ensinava que os homens devem aprender a pensar, antes de afirmarem que encontraram a verdade. E o primeiro passo para aprender a pensar é duvidar das verdades que foram transmitidas pelos mestres do saber. Não se trata de uma dúvida ingênua, uma desconfiança qualquer, mas de um método científico que leva o homem a descobrir a origem da existência humana dentro do próprio ato de pensar. Podemos duvidar de tudo, menos de nossa própria existência como seres pensantes. Este método de pensar deu origem ao racionalismo moderno.  

13. A relação entre a Filosofia e o Mito

A Filosofia mantém uma relação umbilical com a Mitologia. Aliás, a relação entre ambas pode ser comparada a gêmeos siameses que não podem ser separados. Onde está o mito, ali está a filosofia. Há uma tensão permanente que força a filosofia a jamais descansar de sua missão filosófica, ou seja, a tarefa de questionar a lógica dos mitos.
Sempre que o mito se agiganta, a filosofia também cresce, pois o desafiante exige atenção redobrada por parte dos filósofos. Veja o exemplo do mito americano. Ele afirma que os Estados Unidos são imbatíveis em uma guerra, pois seu arsenal nuclear é dez vezes maior que todos os países do mundo reunidos. Quem ousará desafiar este mito? Os norte-coreanos? Os russos? Os chineses? As Nações Unidas?
Os filósofos políticos investigam incansavelmente o mito da hegemonia militar dos americanos, os quais estão mantém suas tropas em constante presença no Oceano Pacífico, nas geleiras da Antártida, nas fronteiras das Américas e no espaço sideral. A propaganda de suas vitórias nas guerras é maciça nos filmes, desenhos e músicas, criando a lenda dos soldados imortais. Mas qual é a verdade que o mito oculta?
Veja o mito da beleza feminina. Qual é o padrão universal para comparar a mulher feia com a bela? Será a cor da pele, a estatura, o peso, o corte de cabelo, o uso das vestimentas? Os filósofos da arte estudam o conceito de beleza em todas as culturas humanas e admitem que “não há padrão”, e sim, modelos de belezas. Ensinam que há um prazo de validade para cada modelo e que a beleza padrão é um mito inalcançável.
Há uma relação de amor e ódio entre mito e filosofia, pois um constrói a ponte e a outra testa com dinamites. O mito se transmuta em outro mito e a filosofia se reveza com outra filosofia. Mas não pensemos que a filosofia seja a vilã ou vítima da história. Ela é a irmã gêmea e siamesa do mito. O outro lado da verdade, ou seja, enquanto o mito se apresenta de forma encantadora e metafórica, a filosofia faz o mesmo de forma discursiva e pouco atrativa. Somente os filósofos gostam da Filosofia.

A própria Filosofia é um Mito! Mas quantos filósofos você já ouviu falando que suas filosofias são mitologias? 

12. Como identificar um Mito?

“Isto é mito”, dizem os demitizadores. Mas para identificar o que é ou não mítico não é tão simples assim, pois a força do mito é sua invisibilidade, ou melhor, sua imperceptibilidade. Ele escapa por entre os dedos de todas as pessoas, e mesmo que alguém consiga identificá-lo, isto não lhe diminui a força que possui. Ninguém desvenda um mito por completo, a curto prazo e de forma satisfatória, pois ele se transforma em outra coisa antes de se esgotar o processo demitizador.

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Veja o exemplo dos filósofos iluministas da Idade Moderna que perseguiram o ideal de esclarecer a mente humana e vencer a era das trevas da Idade Media. Conseguiram? Não! Mais de duzentos anos se passaram e o poder da superstição continua tão vigoroso quanto no tempo dos castelos. O ocultismo tem fascinado cada vez mais as pessoas e as religiões milagreiras não param de se multiplicar.
Para se identificar um mito é preciso “perder a boa fé”, e isto significa a morte da esperança. Alguém te conta que o homem foi até a Lua e voltou. Por boa fé você acredita e não contesta. Mas se passar a desconfiar da história e resolver desmistificar esta lenda, terá que lutar contra as forças políticas que investiram bilhares de dólares em propagandas e livros para reforçarem o mito da conquista espacial. De igual forma se contam algum milagre de cura, a boa fé o ajuda a confiar no mito. Mas se começar a desconfiar do milagre, terá de lutar contra as forças religiosas que lucram milhares de reais com votos e promessas dos fiéis.

Mas existem mitos muito mais difíceis de serem identificados. São aqueles que nós mesmos criamos, acreditamos e apresentamos aos homens. Não os chamamos de mitos, e sim, de convicções e verdades absolutas. Nós defendemos aquilo que acreditamos e dificilmente admitimos que não passam de “lendas urbanas”, como produtos da mente, nada mais.

Francis Bacon chamou estes pensamentos míticos de “ídolos”, portanto, dignos de adoração e de culto. Como poderíamos denunciar a nós mesmos? Como poderíamos chegar a público e admitir que somos idólatras, adoradores de estátuas mudas? O mito não se presta a ser desmascarado com facilidade. Ele oferece muitas faces, e mesmo que saibamos qual é a falsa, ainda restam muitas outras a serem desmascaradas.       

11. Quem valida os Mitos?

Nosso mundo, apesar de se vangloriar do progresso científico, também se banha nas águas dos mitos. Aliás, o progresso científico é o maior de todos os mitos de nosso tempo. Tudo à nossa volta é uma amostra do Grande Mito da Ciência, pois ela criou um mundo repleto de ondas invisíveis que invadem nossos olhos, ouvidos e nosso coração, sem que percebamos a invasão que sofremos. Os celulares são onipresentes nos lares brasileiros e servem como janelas para o mundo, mas também servem como narcóticos para a mente. O mito da Ciência propõe tornar o mundo melhor, mas o custo é a vida real.
Muitos pensadores procuram alertar a humanidade sobre o perigo de continuarmos validando o mito da ciência, mas suas vozes não alcançam os ouvidos de quem se tornou dependente do avanço tecnológico. Como viver sem transporte automotor (carros, aviões, trens e motos)? Como viver sem computador, celular, tablet, televisor e eletroeletrônicos? Como dispensar a radioterapia, quimioterapia e a hemodiálise? Este é o poder do mito! Ele nos aliena de uma vida simples, natural e limitada por recursos modestos. A ciência ganhou o status que as divindades ocupavam e exige culto de fé cega.
Nós validamos os mitos porque há uma relação de dependência com eles. Eles dão sentido a muita coisa trágica neste mundo e alimentam nossa esperança de viver melhor. Mesmo que sejam desmistificados e denunciados como “falsas divindades”, nem por isso perdem o encanto. Pense em uma pessoa que descobre o câncer e sua única esperança é passar por um tratamento a médio prazo, do contrário, morre em poucos meses. O que fazer? Aceitar a tragédia ou fazer o tratamento? O mito da ciência diz que “é melhor adiar a morte, e quem sabe, alcançar a cura”. Mas os oncologistas sabem que “ninguém se cura de câncer, apenas adia o inevitável”.

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Nós validamos os mitos por que precisamos encontrar sentido para viver melhor, até que a morte encerre nosso desejo de lutar. Se desmistificarmos o mundo, precisamos colocar outra coisa no lugar. Quem poderá superar a proposta dos mitos? Quem nos contará a historia dos heróis que tombaram de arma em mãos? Quem nos fará acreditar no paraíso, no céu dos justos, na justiça e no amor? Talvez a religião possa ocupar esta missão, mas a rigidez de seus rituais engessa o espírito humano, e neste caso é melhor continuar com a esperança dos mitos que anestesiam a mente e nos fazem adormecer.

10. Quando surgem os Mitos?

Podemos afirmar sem nenhuma sombra de dúvidas que os mitos surgem nas ocasiões de tragédias. Uma análise sincera dos mitos nos mostra que todos eles possuem o pano de fundo das tragédias, isto é, fatos terríveis, irreversíveis e destruidores produzem um senso comum de angústia nos contadores de lendas e dos poetas e dá origem aos mitos, que é a história recontada com o brilho das metáforas.
Pense na tragédia de um naufrágio onde morrem centenas de bons homens. Como explicar este fato de uma forma diferente daquelas que ouvimos em um noticiário da TV? Os jornalistas procuram ser imparciais e querem manter a distância entre o fato (o que aconteceu) e a interpretação (porque aconteceu). Mas os contadores de mitos não se importam com o fato em si, e sim, com o impacto existencial que este fato pode causar nos auditórios. O barco pode afundar na orla ou nos abismos, mas os poetas colorem a cena para que o trágico seja percebido como algo “sem solução”.
As tragédias não admitem remédio. Elas envolvem a vida humana e transtornam o curso das coisas sem oferecer satisfação a ninguém. Quem sofre uma tragédia procura suavizar a dor e os mitos (como entorpecentes) agem de maneira anestésica, amenizando perdas, frustrações e derrotas. Os mitos que oferecem alegria e prazer também estão envolvidos pela tragédia. O mito do dinheiro, do amor, do saber, da justiça e do paraíso são exemplos do senso trágico que trazemos na alma.
Quando os gregos contavam suas histórias havia uma representação teatral onde as personagens usavam apenas duas máscaras, uma para a tragédia e outra para o cômico. Qualquer que fosse a peça representada o papel principal cabia a personagem trágica, que geralmente perdia os bens, os amigos, a família e a própria vida, adiando suas esperanças para uma vida no Hades onde o deus dos mortos decidiria sua sorte eterna.

Percebemos que há um vazio absurdo presente no mundo. Por mais que a humanidade tenha evoluído em tecnologia, cultura e domínio da natureza, o mondo continua sofrendo com os infortúnios dos terremotos, tsunamis, epidemias e guerras. Como encontrar conforto real diante da tragédia? As religiões oferecem esperança. A mitologia oferece a coragem. E a filosofia?

9. Onde surgem os Mitos?

Há uma real indústria de mitos no mundo! Mas onde ela se localiza, exatamente? Ela está no invisível das palavras que andam de boca em boca, de conto em conto, de história em história, de lenda em lenda. Os mitos surgem no acaso de um fato qualquer, ocorrido naturalmente no mundo, mas percebido de forma fantástica por algum “contador de histórias”. A história bem contada ganha popularidade e passa a ser repetida, alterada e aumentada muitas vezes, tornando-se mito.
Vamos supor o mito do “descobrimento do Brasil”, conforme contam os livros escolares. Ele diz que Pedro Álvares Cabral “tropeçou” e se perdeu das rotas marítimas com uma frota de 1.500 homens. Depois de meses vagando pelo oceano Atlântico, avistaram o Monte Pascal, a Terra de Santa Cruz, o nosso Brasil! Fantástico! Um homem experimentado na ciência da navegação se perdeu no quintal de casa!
Assim são todos os mitos. Surgem como histórias e ganham o peso da Verdade, patrocinados pelos interesses das elites vendedoras de esperanças. Quer negócio mais lucrativo que a ilusão de um mundo melhor? Quantas riquezas foram para a Europa depois que os portugueses, espanhóis, ingleses, franceses e holandeses invadiram o Novo Mundo? E quem patrocinou a exploração das Américas? Os sonhadores, que venderam suas propriedades e investiram tudo para viverem deste lado do “paraíso”, mas ao chegarem por aqui encontraram pobreza, miséria e muita solidão.
Os mitos surgem por interesses econômicos, pois divertem e distraem as pessoas que pagam bem aos artistas, humoristas e heróis do cinema. Enquanto o mito “render lucro” os investidores continuarão a explorá-lo, mas se a renda cair, o mito cai. Assim foi com a Grécia Antiga. Os templos perderam os patrocínios dos governantes e os sacerdotes passaram a ganhar menos com os grandes rituais. Os deuses perderam o prestígio e se tornaram lendários da mitologia. 
Mesmo sabendo que o mito é um produto de consumo e que não possui existência autêntica, as pessoas creem neles e lhes dão vida e longevidade. Pouca gente abre mão de suas crendices e superstições, mesmo com as evidências apontando os absurdos das mitologias. 

8. Por que existem Mitos?

Os mitos existem por causa da boa-fé que as pessoas depositam em suas autoridades, as quais variam desde os pais até os líderes mundiais. Isto nos indica que o mito é um fator ideológico que promove a dominação dos menos esclarecidos e a sublimação dos “bem nascidos”. Percebemos que a consciência mítica é uma engrenagem que faz o mundo girar, tendo aqueles que lucram com o Mito e aqueles que pagam a conta.
Os gregos são considerados os inventores da filosofia justamente por causa da ousadia que tiveram em questionar a dominação dos deuses sobre o mundo dos homens. Primeiro surgiram os pensadores cosmológicos que demitizaram a divindade do mundo. Depois vieram os fisiológicos demitizando a divindade da natureza. Por ultimo chegaram os antropológicos demitizando a divindade dos homens. Os mitos olímpicos foram desafiados e superados, dando origem aos mitos filosóficos.
A humanidade não conhece um só período de sua história sem mitos. Pense no mito da felicidade, da riqueza, da vitória, da vida eterna e da liberdade. Quem neste mundo pode existir sem a boa fé de que é possível ser feliz, aumentar suas posses, vencer os desafios, vencer a morte e ser livre para viver? Estas ideologias movimentam os homens em todas as direções e dão sentido para as angústias, os sofrimentos e as esperanças da humanidade.
O mito chega a ser um entorpecente que suaviza a tragédia do mundo, pois as pessoas que acreditam em uma causa maior aguardam por salvadores, libertadores, avatares, alienígenas e gênios do bem. Acreditam que forças sobrenaturais podem vir em socorro dos pobres e oprimidos, mas a realidade tem se mostrado deprimente para a grande maioria de sofredores.
Ao se desencantar com a consciência mítica a pessoa é desafiada a “pensar por conta própria” e isto significa uma mudança de postura ante os temores que as lendas, os contos e os mitos provocam. Os mitos são proporcionais aos medos e quanto maior o pavor, maior a força do mito sobre aquele que nele acredita. Portanto, os mitos existem por causa do medo e se alimentam dos temores, muitas vezes, sem fundamento real algum.

7. O que é um Mito?


O mito é uma verdade transmitida ao povo e pelo povo por meio de uma linguagem metafórica, ou seja, apoiada pelo universo das figuras de linguagens metafóricas. O mundo mitológico, mítico e lendário está sempre vivo e dinâmico, pois é avivado pela crendice popular e dificilmente é rejeitado em unanimidade.
Os povos antigos sustentavam seus mitos pela força da religiosidade, afinal a crença na existência dos deuses era fortalecida pelo aparato de gigantescos templos, castas sacerdotais sagradas e rituais alucinantes e envolventes que garantiam riqueza, poder e dominação.
Quem desafiaria o Mito de Hades, o deus dos mortos? Quem venceria a impetuosidade de Poseidon, o deus dos abismos? Quem ousaria desmistificar a tirania de Zeus, o deus do Olimpo? Os mitos andam nas costas de seus escravos, os quais não ousam levantar os olhos acima dos ombros e questionar a veracidade das lendas contadas de boca em boca, desde as rodas de amigos até as câmaras secretas dos palácios e templos.
O mito não é uma inverdade! O mito é uma realidade que vivenciamos sem desconfiarmos de suas artimanhas, pois no fundo de tudo o mito não é tão gigantesco, poderoso e glorioso como todos acreditam. Ele sofre metamorfoses e cresce em suas proporções por causa da ingenuidade popular que lhe acrescenta mais e mais status.
Veja o mito da educação escolar! Ele sustenta que uma pessoa com boa formação terá um futuro melhor que aqueles desafortunados fora da escola. Para sustentar este mito se investe milhares de reais em propaganda e marketing, provando que este produto não se vende por si mesmo. Tem muita gente com formação e sem futuro. Também tem muita gente semi-letrada que vive bem com sua família e amigos.
Quem contestar o Mito da Educação será comparado a Sócrates na Atenas da antiguidade, pois ele foi acusado de ateísmo simplesmente por que incitava os jovens a explicarem a razão de suas crendices e superstições. O mesmo acontecerá com o tresloucado que enfrentar a Lenda dos Guardiões do Saber. Na verdade, a formação escolar não acrescenta muito para quem não gosta de estudar. E quem estuda com gosto, aprende em qualquer lugar.